Maurice Tardif e Claude Lessard
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Qual a importância da estrutura que engloba a educação e seus desdobramentos? Para os autores deste livro o processo educacional depende essencialmente da interação entre os envolvidos, seus trabalhos e seus respectivos papéis neste contexto. Que constituem a perspectiva de eficiência do ensino.
“Eu pensava que fosse instruir, mas não instruo.
Eu educo, eu partilho, sobretudo, e aprendo”
(Uma professora do primário)
Os fins do trabalho docente.
Todo trabalho humano possui fins – motivos, intenções, objetivos, projetos, planos, programas. Eles se manifestam de diversas formas no decorrer da ação. Podem ser formalmente declarados e apresentados, ou nascer durante a ação, por exemplo, pela pressão das circunstâncias. Os fins vão se transformando com a
experiência adquirida pelo trabalhador.
Schwartz (1988) explica que essa experiência não se limita a produção de resultados, mas é também um processo de formação e de aprendizagem que modifica os conhecimentos e a identidade do trabalhador, e suas próprias relações com o trabalho. Consequentemente, os fins não são uma extensão suplementar do
trabalho humano.
Como o mostra uma venerável tradição teórica que remonta a Aristóteles, passando por Kant, Marx e hoje, Habermas e Guiddens. Os fins constituem um modo fundamental de estruturação da atividade humana em geral e da atividade laboral em particular, concebidas enquanto ações finalizadas, temporais, instrumentais, teleológicas. Marx diz em A ideologia alemã, é que o ser humano se distingue do trabalho da formiga, do castor, da abelha, porque elabora uma representação mental de seu trabalho antes de realizá-lo e a fim de idealizá-lo.
Nos estabelecimentos escolares atuais, tais lógicas: negociação, conflito, colaboração, etc...mostram o difícil problema da coordenação dos fins entre o sistema escolar e os diversos atores que trabalham nele. Eles devem perseguir fins comuns, o que gera o problema de coordenação. Um segundo problema: a articulação entre os fins das organizações escolares e seus ambientes. Tais ambientes não são espaços naturais mais sociais, onde vários grupos e atores se encontram que se esforçam para influir de várias maneiras na escola impondo-lhe seus próprios fins. A docência é chamada pelos autores de atividade instrumental, isto é, uma atividade planejada e estruturada.
Atenção: ensinar é agir em função de objetivos no contexto de um trabalho relativamente planejado no seio de uma organização escolar burocrática Distante das idéias românticas de uma profissão em que a autonomia professoral marcou várias gerações, explicando o sentimento de "vocação" para essa atividade, o trabalho dos professores é cada vez mais codificado, racionalizado pelas diretivas ministeriais, prescrevendo em detalhe o programa a ser desenvolvido e a progressão a ser levada em conta. Diretivas do Ministério da
Educação, orientações pedagógicas, manuais etc.
E, sem dúvida, o papel importante do material pedagógico induz certas práticas, nem sempre aceitas pelos professores, mas pelas quais se sentem "prisioneiros" por conta da imposição da mídia e das famílias.
Além disso, a organização escolar comporta diversas divisões e subdivisões (por nível, por matéria, por campo) que traduzem a complexibilidade do ensino de massa, importância da hierarquia das disciplinas nos programas, quase sempre negligenciada nas pesquisas desse gênero, implica exigências diversas no
desempenho dessa profissão.
Como os professores veem e experimentam seu mandato de trabalho em relação à tarefa recebida da escola e de seu “objeto humano” de trabalho?
É graças ao trabalho dos professores que a escola consegue atingir seus fins; eles estão no centro das transações entre a organização escolar e seus principais “clientes”, os alunos.
O professor que é responsável pelas matérias consideradas "nobres" no programa escolar (matemática, por exemplo) é diversamente avaliado pela administração escolar, pelos alunos e pelas famílias. Entretanto, os que são responsáveis por matérias pouco valorizadas no cômputo geral devem fazer prova de maestria para "prender" a atenção dos alunos e estimular seu empenho nos saberes transmitidos.
Por meio da análise da evolução do sistema escolar, pela relativa democratização do público do secundário e pela complexificação dos objetivos do ensino, o professor é colocado diante de uma atividade em completa mutação. O aumento de tarefas, os novos tipos de comportamentos juvenis, seja com relação à
autoridade professoral, seja com o significado do ato de aprender, levam os professores a construir regularmente a "ordem escolar".
A relação com os pais de alunos se modifica: o comportamento de "consumidor" se estendeu na medida em que as incertezas do futuro profissional ou social das camadas médias e altas da sociedade se tornaram realidade. Os autores se referem, nesses casos, à pesquisa de campo realizada: incompreensões e
tensões aparecem entre professores e familiares dos alunos, para os quais a ideia da "eficiência" dos saberes transmitidos ganha uma significação diferente para cada um.
Os autores chamam a atenção para o papel dos sindicatos mesmo se eles perderam a influência dos áureos tempos quando desfrutavam de um peso junto às instâncias ministeriais, podendo impor ou arbitrar as orientações de políticas de ensino ou de desenvolvimento de carreiras dos professores. Entretanto, apesar do enfraquecimento, os sindicatos preservam o papel importante na gestão dessas carreiras e nas orientações consideradas contrárias aos objetivos que defendem (forma de seleção dos alunos, conteúdos dos programas, política de profissionalização do ensino secundário etc.) Aqui, o encontro de interesses entre professores e pais de alunos, ambos de mesma origem social (classes médias ou superiores intelectualizadas), permite o sucesso desse tipo de ação sindical. Por meio dessa ação, o trabalho coletivo dos professores aparece reforçado, favorecendo o sentimento de coesão do grupo profissional.
De uma maneira geral, os autores mostram que a atividade dos professores é um exercício profissional complexo, composto, na realidade, de várias atividades pouco visíveis socialmente. A experiência constitui a expressão de aprendizagem profissional e, pelo contato diário com os alunos e os colegas, torna-se o modo de adquirir competências profissionais que se traduzem no perfil do "bom professor".
Outro fator importante é apontado pelos autores na construção dessa profissão: as condições sociais de cada estabelecimento escolar, fruto da situação local em que o colégio está inserido, correspondendo ao tipo de público escolar junto aos quais eles exercem o ensino. O sentimento de satisfação ou de esgotamento moral com relação à profissão é fortemente ligado a essas condições sociais.
A Sociologia do Trabalho já havia demonstrado, com riqueza de detalhes, em outros campos profissionais (campesinato, operários, executivos ou mesmo altos funcionários) a importância dessas condições sociais no desempenho das atividades profissionais. Aqui, o interesse é a demonstração de que as dificuldades observadas estão presentes em vários países, dispondo de condições sociais, políticas ou econômicas bem diferentes entre si, exprimindo um problema mais profundo que seriam a crise da educação e as implicações desta crise no trabalho dos professores e no trabalho educativo em geral.
As transformações nas políticas educativas na maioria dos países, caracterizadas pela extensão da escolaridade secundária, criaram novas tensões devido principalmente ao aprofundamento das desigualdades entre as "boas escolas" e as outras. Mesmo num país onde o ensino é obrigatório e gratuito,
distribuído igualmente a todo território nacional, não se impediu que os contrastes sociais se instalassem entre o "centro" e a "periferia". A tendência a aprofundar as diferenças sociais conduz, de um lado, à competição entre as "boas escolas" e, de outro, a deixar aos professores a dura tarefa de lidar com o público desfavorecido das escolas da periferia. Cabe a eles encontrar os meios de exercer a profissão e
obter resultados de performance avaliados por critérios nacionais generalizados.
Artigo 7
Foram definidas anteriormente, as situações escolares quotidianas como sendo situações sociais caracterizadas por interações elementares entre seres humanos. Uma vez que elas estão no próprio centro do trabalho docente, iremos nos ater mais especificamente às interações entre os professores e os alunos em sala de aula, procurando colocar em evidência suas principais características.
O que acontece numa sala de aula?
Obviamente acontecem todo tipo de eventos e cada classe possui, suas características únicas e originais. Mesmo assim, pode-se admitir que essas características possuem certa recursividade e certa estabilidade, que se repetem de uma classe a outra. É nesse espírito que Doyle (1986) propôs uma descrição bastante clássica dos eventos que se produzem na sala de aula, a partir das seguintes categorias:
A categoria de multiplicidade se refere ao fato de, numa aula, ocorrerem diversos eventos ao mesmo tempo ou num período muito curto de tempo.
A imediatez significa que os eventos que ocorrem durante uma aula chegam, geralmente, sem previsão nem anúncios, necessitando de adaptações e estratégias imediatas, “espontâneas”: um barulho, uma mão levantada, uma pergunta, um cochicho, a resposta de um aluno, um gesto do professor, etc., tudo isso acontece no mesmo instante que tais atos se iniciam.
A rapidez caracteriza o desenvolvimento próprio dos acontecimentos durante a aula, sua sucessão, seu encadeamento, sua fluência. A imprevisibilidade significa que os acontecimentos, ao longo de uma aula qualquer, pode surgir de forma imprevista, desviada, inesperada, surpreendente, em suma, podem iniciar-se sem planejamento na medida em que a trama das ações é desenvolvida.
A visibilidade exprime o fato de uma aula ser uma atividade pública desenvolvida na presença de 20 a 30 pessoas que são simultaneamente participantes e a parte inteira. Essa dimensão pública do trabalho docente deve der posta em relação com o caráter fechado do local de trabalho: a classe é uma célula de trabalho, ao mesmo tempo fechada para o exterior e aberta para o interior. Tal fenômeno organizacional de fechamento e abertura é típico da profissão docente: tudo que se passa na classe é aberto e oferecido aos participantes, mas o conteúdo da classe não deve avançar ao exterior, para as outras classes e a escola. A visibilidade parece significar duas coisas no âmbito do plano do trabalho docente.
1. O professor não pode ocultar nada aos alunos, e tudo que ele faz é objeto de interpretação das partes deles.
2. As interações entre os membros da classe vão tomando, imediatamente um aspecto coletivo, social, mesmo quando elas são individualizadas como, por exemplo, quando o professor se dirige a um aluno em particular ou quando dois alunos interagem entre si.
A historicidade significa que as interações entre os alunos e os professores acontecem dentro de uma trama temporal – diária, semanal, anual – dentro da qual os acontecimentos adquirem um sentido que condiciona de várias maneiras as ações seguintes: a historicidade diz respeito tanto à instauração de regras disciplinares e da gestão do grupo quanto aos conteúdos dos ensinados.
As categorias de Doyle esclarecem bem o modo como as coisas ocorrem na classe. Contudo, parece-nos que estas categorias se situam num plano descritivo. Devido a isso, elas não permitem compreender porque os acontecimentos da classe se regem precisamente por esses fenômenos de multiplicidade, simultaneidade, historicidade, etc. Pelo que entendemos, embora ela seja frequentemente utilizadas, poucos autores se deram ao trabalho de refletir sobre os fundamentos de tais categorias.
Para bem conduzir essa reflexão, devemos ir além do âmbito da descrição e situar-nos no plano da compreensão, encarando não apenas a ecologia da classe, mas também as condições que tornam possível e pertinente a utilização das categorias precedentes.
Para tais questões iniciais propomos introduzir duas novas categorias,
a)interatividade
b)significação
Essas duas novas categorias não se situam no mesmo plano das categorias de Doyle, pois estas são conseqüências das duas primeiras. A interatividade caracteriza o principal objeto do trabalho do professor, pois o essencial da sua atividade profissional consiste em entrar numa classe e deslanchar um programa de interação com os alunos. Isso significa que a docência se desenrola concretamente dentro das interações: estas não são apenas alguma coisa que o professor faz, mas constituem, o espaço – no sentido do espaço
marinho ou aéreo – no qual ele penetra para trabalhar. Por isso, como já mencionamos várias vezes, ensinar é um trabalho interativo.
Atenção: Toda ação social é voltada para o outro, pouco importa se ele está fisicamente presente ou não. Essa característica da ação é estritamente vinculada à linguagem, isto é, à comunicação, em sentido amplo.
Do ponto de vista da ação comunicacional, ensinar não é, fazer alguma coisa, mas fazer com alguém alguma coisa significativa: o sentido que perpassa e se permuta em classe, as significações comunicadas, reconhecidas e partilhadas, são, o meio de interação pedagógica. Assim a pedagogia é, uma ação falada e
significativa, em suma, uma atividade comunicada.
A pedagogia escolar se dirige primeiramente ao outro – um outro coletivo – graças à atividade de um sujeito que fala, cujas ações são dotadas de sentido e que se esforça de diversas maneiras para obter sua colaboração.
Mas, onde devemos colocar a dimensão significativa das ações?
A significação de uma ação é constitutiva da ação ela mesma. Ela ocorre em vários âmbitos: na intenção ou motivo do ator, bem como também em seus objetivos; no processo de comunicação interativa entre os atores que procuram agir interpretando a atividade significativa dos outros; no “pano de fundo” da ação, quando os atores presentes mobilizam sistemas de comunicação já existentes para se compreenderem mutuamente: linguagem natural, gestos corporais (piscadas de olhos, sorrisos, etc.), referências culturais, normas comuns, etc; com referência ao contexto da ação, ou seja, na estrutura da concretização prática ligada ao quadro sociofísico de sua realização (Pharo, 1985).
A situação na sala de aula é construída paulatinamente pelas novas interpretações dos envolvidos em função das interações que se produzem. Desse ponto de vista, uma sala é uma espécie de projeto ou programa a ser realizado em comum. A respeito disso, sempre do ponto de vista da ação comunicativa, a tarefa dos
professores parece operar em três planos constantemente inter-relacionados uns com os outros: a interpretação, a imposição e a comunicação.
Atenção: a interpretação dos acontecimentos de classe funciona a partir de uma “grade” que opera em dois planos: antes de tudo, há respostas rotineiras, isto é, planos simplificados, modelos básicos da realidade da turma (em termos hermenêuticos: pré-julgamentos, expectativas mil vezes confirmadas), que permitem ao professor gerir os eventos e organizá-los rapidamente; em seguida, há um rico repertório de ações acumuladas pela experiência, que permite que o professor improvise.
Nesta segunda parte, nós tentaremos compreender melhor a natureza dos processos interativos em relação ao objeto de trabalho e passaremos a uma sistematização teórica dos fenômenos analisados.
Para melhor entender as particularidades da docência, apresentamos uma comparação entre o objeto de trabalho industrial e o objeto do trabalho docente, procurando, novamente, que seja heurística e didática. Nossa tentativa será mostrar como a natureza mesma desses objetos leva a práticas diferentes entre os
trabalhadores.
As diferenças entre o objeto material e o objeto humano são inúmeras e importantes. Elas induzem atividades muito diferentes, conforme trabalhemos com a matéria ou as pessoas.
Uma primeira diferença essencial entre as duas formas de trabalho está na natureza serial do objeto do trabalho industrial e na natureza ao mesmo tempo individual e social do objeto do trabalho docente, isto é, os alunos. Ora, essa dimensão individual significa que o objeto do trabalho docente é portador de
indeterminações, pois cada indivíduo é diferente e parcialmente definido por suas diferenças, as quais é preciso respeitar.
Embora ensinem a coletividades, os professores não podem agir de outro modo senão levar em conta as diferenças individuais, pois são os indivíduos que aprendem e não a coletividade.
Esta componente individual, significa também que as situações de trabalho não remetem as soluções de problemas gerais, universais, globais, mas as situações problemáticas marcadas pela instabilidade, a unicidade, a particularidade dos alunos, que são obstáculos inerentes a toda generalização, a receitas, em
uma, à racionalidade instrumental pura e simples. É por isso que as normas burocráticas aplicadas pelas grandes organizações escolares se revelam, muitas vezes, injustas ou inaplicáveis aos indivíduos. Os trabalhadores sabem por experiência que os padrões que a organização aplicados tais e quais, podem
tornar-se odiosos para os alunos considerados individualmente: o que vale para um revela-se absurdo para outro; os alunos “lentos” não aprendem como os “rápidos”.
Tais descrições permitem afirmar a consideração relativa à individualidade do objeto. Mesmo trabalhando com coletividades, os professores não podem tratar os indivíduos que compõem essas coletividades como elementos como uma série homogênea de objetos. Pelo contrário, devem levar em conta as diferenças, as
reações, a natureza individual como exigências inerentes que definem a própria natureza de sua tarefa.
Na docência, alguns alunos parecem simpáticos, outros não; com alguns grupos a coisa flui, com outros tudo fica bloqueado, etc. Em boa medida o trabalho docente repousa sobre emoções, afetos, sobre a capacidade não só de pensar nos alunos, mas também de perceber e sentir suas emoções, seus temores, suas alegrias, seus próprios traumas, etc. O professor experiente sabe tocar o piano das emoções do grupo, provoca entusiasmo, sabe envolvê-los na tarefa, etc. Num outro âmbito, a implicação dos professores na solução dos problemas da sociedade (ensinar a harmonia racial, valores não-sexista, escutar problemas pessoais,
consolar, ensinar os comportamentos sociais básicos, etc.) constitui um peso difícil de carregar. Além de tudo, por ser o “produto” um ser humano, os professores se preocupam mais com a qualidade e o bem estar global das crianças.
Diferentemente dos objetos de série da indústrias, que são homogêneos, os alunos são heterogêneos. Eles não são todos dotados das mesmas capacidades pessoais e das mesmas possibilidades sociais. Sua flexibilidade, sua capacidades de aprender , suas possibilidades de engajar-se numa tarefa, sua concentração, etc., tudo varia. Esse fenômeno da heterogeneidade da clientela é importante para compreender a docência atualmente, mais e mais confrontada com alunos heterogêneos quanto a sua proveniência social, cultural, étnica e econômica.
No contexto do trabalho industrial, o trabalhador controla diretamente o objeto, ao passo que o professor precisa contar com a colaboração do objeto, seja voluntária ou não. Ele nunca tem controle total dos alunos, sobretudo porque eles saem da classe e escapam, assim, ao seu poder. Essa ausência de controle direto e total explica, em parte, a opinião da maioria dos professores de profissão, de que, por um lado, seu trabalho é muito difícil de se avaliar e, por outro, eles podem ser responsáveis pelos meios que utilizam com os alunos (Gauthier et al., 1997), mas não pelo insucesso, pois os alunos ficam sujeitos a uma infinidade de influências que podem afetar seu rendimento escolar.
Atenção: O trabalho humano, qualquer que seja, lida com um objeto e visa a um resultado. Todavia, qualquer que seja o processo de trabalho, ele supõe a presença de uma tecnologia através da qual o objeto é abordado, tratado e modificado. Não existe trabalho sem técnica; não existe objeto de trabalho sem relação técnica do trabalhador com o objeto. Esse fato levanta a questão da tecnologia do ensino e, mais amplamente, das tecnologias da interação. Essa questão é difícil e não tem sido estudada por nenhum pesquisador.
Nossa ambição, portanto, não é de esgotá-la aqui. Contudo, ela requer algumas opções conceituais que precisamos exprimir brevemente. Nós designaremos a tecnologia do ensino, simplesmente o conjunto dos meios utilizados pelos professores para chegar a seus fins nas atividades de trabalho com os alunos. Tal
definição significa que a tecnologia do ensino não é mais que os meios utilizados pelo professor para atingir seus objetivos em suas interações com os alunos.
A coerção reside em condutas punitivas reais e simbólicas desenvolvidas pelos professores na interação com os alunos em sala de aula. Tais condutas são fixadas, ao mesmo tempo, pela instituição escolar, que lhes estabelece limites variáveis de acordo com as épocas e contextos, e pelos professores, que as
improvisam ao vivo, como sinais pragmáticos regulatórios para a ação em curso: uma olhada ameaçadora, uma cara feia, insultos, ironia, apontar o dedo, etc. A coerção reside também nos procedimentos desenvolvidos pelas instituições escolares para controlar as clientelas: exclusão, estigmatização, isolamentos,
seleção, suspensão, etc.
Se existe educação sem coerção física, sem exigência material direta sobre o aluno, não existe, pelo contrário, educação sem exigência e coerção simbólica. De um modo ou de outro, a missão da escola e a tarefa dos professores consiste em manter os alunos fisicamente na escola e na classe durante longos anos para submetê-los a programas de ação que eles não escolheram, para aviá-los a partir de critérios abstratos e, muitas vezes, difíceis, simbolicamente falando, para as pessoas às quais são aplicados.
Desde Weber (1971), costuma-se distinguir diferentes tipos de poder: o poder da pura obrigatoriedade e o poder legítimo, este último apoiando-se em diferentes tipos de autoridade:
1) a autoridade tradicional (que repousa no costume, na convenção, etc.);
2) a autoridade carismática (que repousa nas qualidades do lidere e do chefe);
3) a autoridade racional-legal (baseada em normas impessoais, num sistema de direito, uma deontologia, incorporada à organização burocrática).
Esses três tipos de autoridade também influenciam na docência. Atenção: A autoridade reside no respeito que o professor é capaz de impor sem coerção aos alunos. Ela está ligada a seu papel, à missão da qual a escola o inverte, bem como à sua personalidade, seu carisma pessoal. Este aspecto é muito importante para compreender a transformação de atributos subjetivos em condições objetivas da profissão e em tecnologia interativa.
A persuasão é a arte de convencer a outrem a fazer alguma coisa ou acreditar em alguma coisa. Ela se apóia em todos os recursos teóricos da linguagem falada (promessas, convicção, dramatização, etc.). Ela se baseia no fato de que os seres humanos (e, particularmente, as crianças e os adolescentes) são seres de paixões suscetíveis de se deixarem impressionar, adular, dobrar, convencer por uma palavra dirigida a seu temor (seu desejo, sua vontade, sua cólera, etc.).
A persuasão constitui o fio diretor da tradição educativa ocidental desde os sofistas. Sua importância se deve ao fato de o meio linguístico ser o vetor principal da interação entre professores e alunos. Ensinar é agir falando.
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